quarta-feira, 31 de janeiro de 2024

Os bandidos que já não são de verdade, por Luís Ernesto Lacombe

 

Foto: Midjourney

Não adianta gritar... Ninguém vai pegar o ladrão, não o que era considerado um ladrão de verdade, e deixou de ser. Pega! Pega! Você vai ficar sem voz, e o criminoso que não é mais criminoso seguirá tranquilamente. E ele ainda vai debochar de você. Ele pode quase tudo, foi autorizado a fazer quase tudo. Pode roubar celular, carro, pode sequestrar, bater em mulher, corromper menores, traficar drogas, fazer contrabando, pode furtar o que quiser, não usar armas ou usar as armas que achar necessárias. Ele precisa sempre ser compreendido e apoiado. Mesmo estupradores e assassinos merecem tolerância e um abraço emocionado... Merecem livros, flores, amor. O que se entendia outrora como bandidagem virou coisa boa, e é um patrimônio nacional.

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Eles estão em todas as classes sociais, em todas as áreas, tomaram conta de tudo. Podem odiar, ameaçar, perseguir, torturar. Podem corromper e ser corrompidos. Aceitam triplex na praia, sítio, reformas dos imóveis, depósitos gordos no exterior, presentes caros, verba para instituto, viagens de helicóptero ou de jatinho. Eles podem comprar parlamentares, ou ser parlamentares e se vender. Podem fazer politicagem e politicalha. Gostam de cargos no governo... Gostam de estelionato, todo tipo de estelionato. Podem dilapidar estatais, fundos de pensão... Bandido que não é mais bandido está sempre aí para qualquer negócio. E, mesmo que diga na cara de um juiz desavisado que “seu apego a poder e dinheiro é um vício”, pode sorrir e sambar nas redes sociais.

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Os bandidos de verdade não são mais bandidos. Não serão presos. Se estiverem presos, serão soltos. A Justiça já criou jurisprudência sobre isso. Não a Justiça de verdade, essa foi extinta, mas a que decretaram que é de verdade e é detentora da verdade. Se falavam em cleptocracia, passou. Se falavam em roubalheira, passou.

Nenhuma prova resiste a uma furadeira potente. Nenhuma delação, nenhum acordo de leniência, nenhuma confissão dos bandidos que eram de verdade, nada disso existe mais. Produto do roubo? Nunca houve, claro.

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As leis agora têm donos; eles decidem o que vale e o que não vale, de que maneira vale ou não vale e para quem vale e para quem não vale. Revogam-se as disposições (e o choramingo) em contrário. Revoga-se o contrário, o que se opõe ao bandido que era de verdade, e deixou de ser. Não está tudo liberado porque há os novos bandidos, e esses serão condenados. Aos outros nada será imputado. Nem cueca com dólares, nem cueca com reais, nem mala de dinheiro no estacionamento de shopping, nem malas e mais malas em apartamento com milhões e milhões de reais. Qual o problema disso tudo? Temos as nossas tradições, e quem se opuser a elas, mesmo que no plenário da Câmara Federal, vai levar tapa na cara, ou coisa pior.

Quem apoiava os bandidos que eram considerados de verdade e se afastou deles, acusando-os de praticar crimes, agora entendeu como deve ser. Estão todos juntos de novo. Quem não estava com os bandidos que eram considerados de verdade, quem disse que eles voltariam ao local do crime já está lado a lado com eles. Esse é o Brasil pacificado, que transforma o que era ruim em coisa boa, o errado em certo, o desonesto em honesto, os defeitos mais abjetos nas maiores qualidades, os pecados mais horrendos em virtudes quase divinas. Os crimes agora são exclusivos daqueles que não eram bandidos de verdade, que nunca foram. E quem disser o contrário pagará por isso.

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